Todo doutorando que se preze deve fazer o que se espera dele: escrever artigos, a unidade básica da produção acadêmica convencional. Por sorte, ou coincidência, descobri que uma revista da Faculdade de Educação da Unicamp, a “Educação Temática Digital“, está com chamada aberta para a submissão do tal artigo, esse que a gente deve acumular uma porção pra pontuar no qualis.
Ironias à parte quanto à realidade produtivista que hoje impera na academia, a proposta da revista me agradou. Também quanto ao tema do próximo número, que já falo sobre ele, mas porque ela tem/defende a política de livre circulação do material que publica, algo interessante pra uma revista qualis A1 em Educação.
De fato, descobri que várias revistas aqui da Faculdade de Educação seguem essa política, disponibilizando livremente o conhecimento que é produzido por pesquisadores, professores e estudantes desta área do conhecimento.
Pois então, usufrui dessa condição e dei uma sapeada nos números passados, no que encontrei artigos que tratam de assuntos bacanas, que me interessam, como as concepções de conhecimento e sua produção e educação popular, assunto caro quando a proposta é estudar a produção e reprodução simbólica de movimentos camponeses. Vale também o comentário a respeito da apresentação dos autores, cujo resumo e link para o texto completo são acompanhados de uma fotografia que identifica a pessoa que escreveu o artigo, o que, de certa forma, humaniza um pouco a fria cultura científica.
A temática do próximo número será Educação Ambiental e Sustentabilidade Socioambiental na Educação. Em que pese a indefinição dos termos mencionados, julguei possível a redação de uma proposta de artigo. Pois então fui logo separando os livros de cabeceira que me inspiram pensar elementos pedagógicos na relação entre a educação e a agroecologia.
Separei o livro “As três ecologias” (tem aqui na biblioteca do blog), do Félix Guattari, que ainda não comecei a reler. A contribuição desse livro é a proposta que o Guattari faz de pensar o entrelaçamento entre a dimensão social, a dimensão subjetiva e a ambiental na abordagem dos problemas contemporâneos. Talvez use essa articulação que ele propõe como uma forma de “atestar”, como um gabarito que possa ratificar uma proposta teórico-metodológica “sustentável” de educação, ou seriamente implicada na solução dos problemas que vemos por aí. Sinto que a experiência que vivo na Educação do Campo — aquela promovida pela práxis dos movimentos sociais do campo — é a única que se encontra a altura do desafio contemporâneo, a única que vivênciei, por certo.
Peguei também um livro do Maturana chamado “Cognição, Ciência e Vida Cotidiana” (também na biblio), cuja leitura inicial já me instigou muito, pois ao tratar dos fenômenos da percepção Maturana acaba por discorrer sobre as implicações para a própria forma de pensar o conhecimento científico e filosófico. Creio que essas leituras, que são mais do tipo “ampliando as fronteiras” do meu conhecimento, acabam por ser mais inspiradoras do que de fato base referencial para esse artigo que quero escrever. Para quem quiser saber mais, como eu nesse momento, acabei de achar um artigo que busca descrever as ideias desse velhinho chileno, que busca explicar o conhecer explicando o conhecedor — clique aqui.
Mas o que mais me surpreendeu, nesse momento de arquitetar uma argumentação científica para a escrita desse trabalho, foi encontrar uma tese de doutorado lá da federal do Rio, por um lado, e também fazer as leituras de alguns artigos do Ivan Amaral, aqui da Educação da Unicamp. A tese discorre sobre a politização da questão ambiental para o MST. Aliás, encontrei ela acessando a Biblioteca Digital da Questão Agrária Brasileira, acervo que vale a pena dar uma olhada. Articulando essa questão que a Mônica Rodrigues apresenta em sua tese com o debate que o Prof. Ivan faz sobre Educação Ambiental, penso que sairá um caldo interessante.
A Mônica aponta a agroecologia como a estratégia produtiva e política adotada pelo Movimento, do modo que não há exatamente uma “questão ambiental” para o Movimento, há sim uma questão dos modelos de sociedade e de produção que precisam ser reconstruídos — pelo menos essa a a leitura que faço do Movimento. Da mesma forma, para o Prof. Ivan, não devemos pensar a Educação Ambiental como uma nova corrente pedagógica, ou mesmo como uma dimensão da educação em geral. Tampouco como um novo enfoque para a educação, na medida em que a temática ambiental faz parte de qualquer modelo de ensino — ela sempre esteve presente, de uma forma ou de outra, no processo educativo. O que importa, na visão do professor, é detectar quais as concepções de ambiente, educação e sociedade que estão disseminadas em cada proposta pedagógica, já que essas concepções implicam numa educação ambiental mais ou menos crítica e emancipatória, com perspectivas mais ou menos cientificista, antropocêntrica, utilitarista e fragmentária.
Enfim, é mais ou menos por aí que devo prosseguir. Sinto que a experiência que tive no Curso Médio Integrado ao Técnico em Agroecologia – MST/Feagri/Cotuca/Unicamp, durante os anos de 2008 a 2010, continua a me inspirar, projetando para minha pesquisa de doutorado parte da vivência prática que toda teorização carece.
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