Semana passada um coordenador de área da Capes deu uma palestra sobre os cursos interdisciplinares de pós-graduação no Brasil… para poupar comentários meus sobre a apresentação, colo aqui o de uma amiga, a Bruna, que também assistiu-a:
discurso vazio, cruel, velho, vencido, acabado...
Mas enfim, ao final do dia, além de sentir o mesmo, redigi um pequeno escrito:
Inevitável (e incrível também) foi reconhecer a fotografia presente naquele power point… O pessoal de Sumaré colhendo tomates da agricultura familiar, lá nos anos 80, início do Assentamento I. Vejo a família Queiroz, lembro-me logo de Altair, agricultor-experimentador fazendo de seu lote um verde mosaico de texturas foliares: a longa e escura da bananeira, a espalmada da mandioca, o cafezal oferece as suas onduladas com as estípulas interpeciolares… tudo isso no chão arenoso, típico dos solos de cerrado. Sumaré, seu Horto e suas famílias assentam-se sobre uma mancha-fragmento de cerrado em meio a um corpo de mata atlântica que remanesce entre nós, este mesmo bioma-morada eleita para metropolitanizar-mos a partir de Campinas, terra do café – de antigas sesmarias na trilha dos goiases – por onde muito escravo foi açoitado. É o mesmo sangue que hoje respinga por sob a fria pressão das botas dos PM’s, criminalizando os movimentos populares que ousam desindustrializar, desracionalizar e humanizar a produção desvairada das sojas sequestradas pelas mega-colheitaderas – também presente no power point -, arauto da chamada agricultura de precisão – essa que desprecisa saber se é cerrada, se é atlântica, se é querida, áspera ou africana a pele, o sangue ou o solo onde Queirozes antes ali viviam. A importância do contato direto com certa realidade em atividades educacionais dão a chance de explorar e aprofundar diversos mecanismos de aprendizagem que não são e nem podem ser proporcionados de outra maneira. A vivência em assentamos rurais, como o de Sumaré, e o real contato com as pessoas do lugar viabilizaram-me uma “existência” outra, neste caso uma existência agrária, mesmo que temporária, preenchida de transcendência, discernimento, diálogo, comunicação e participação. Ações nesta concepção de extensão, que se prestam a aproximar estudantes de uma dada realidade concreta, para além das cercas da Universidade, causam grande impacto na formação humana das pessoas, para além dos tecnicismos que nos atrofia os valores mais nobres – elas rompem as fibras mais endurecidas da dissociação esterilizante entre o que categorizamos como ensino, pesquisa, extensão, trabalho, vida, cultura, profissão, pessoalidades, família, sociedade, científico, popular, universidade. Quiçá um dia cheguemos lá, indissociáveis, homens e mulheres arroz-integral, ao invés deste branco, refinado, descaracterizado…
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